O Programa do Governo da Aliança Democrática (AD) foi esta quarta-feira aprovado, em Conselho de Ministros, e entregue na Assembleia da República, onde vai ser debatido nos próximos dois dias. Face à apresentação, vieram as críticas, nomeadamente por falta de “diálogo”, e o anúncio de mais uma moção de rejeição, por parte do Bloco de Esquerda (BE). 

Da Esquerda à Direita, fala-se de um programa “insuficiente”, pouco “ambicioso” e que corresponde a um “retrocesso”. 

De notar que o ministro da Presidência, António Leitão Amaro, afirmou que o documento, de 185 páginas, tem como base o programa eleitoral da AD, mas incorpora “mais de 60 medidas de programas eleitorais de outros partidos com representação parlamentar”.

O que disseram os partidos?

IL: Programa é “insuficiente para as transformações” de que o país precisa

A Iniciativa Liberal (IL) foi o primeiro partido a pronunciar-se, considerado o programa do XXIV Governo Constitucional “insuficiente para as transformações urgentes de que o país precisa”, criticando a falta de uma “reforma estrutural” na saúde ou as medidas para salários e IRS. 

“Numa primeira análise, o que constatamos é que este programa é um programa que é insuficiente para as transformações urgentes de que o país precisa e, portanto, fica aquém das necessidades do país e daquilo de que os portugueses precisam”, afirmou Mariana Leitão, líder parlamentar da IL, no Parlamento.

Questionada qual vai ser a posição da IL quanto à moção de rejeição ao programa de Governo apresentada pelo Partido Comunista Português (PCP) – ainda antes de o Bloco anunciar que ia avançar com a própria moção de rejeição – , a liberal considerou que essa iniciativa é “um pouco extemporânea”.

“O programa do Governo diverge daquilo que nós assumimos como algo necessário e urgente para o país em algumas matérias, mas não me parece que seja o suficiente para votarmos favoravelmente uma moção de rejeição“, afirmou, referindo ainda que a IL irá “continuar a fazer no parlamento uma insistência” em muitas das suas medidas, podendo “haver uma ou outra situação em que haverá convergências”.

Livre critica “medidas avulsas” da oposição no programa do Governo

Seguiu-se o Livre, também pela voz da sua líder parlamentar. O partido criticou o Executivo por ter incluído “medidas avulsas” da oposição no Programa,  sem dialogar com estes partidos, acusou-o ainda de recuar em algumas promessas eleitorais.

“Esta inclusão de medidas avulsas de programas eleitorais de outros partidos parece-nos curiosa, mas foi feita sem diálogo com os partidos. Nós soubemos agora, quando o programa de Governo foi apresentado, nem sabemos que medidas do Livre na verdade constam do programa de Governo porque não houve esse diálogo”, criticou Isabel Mendes Lopes, em declarações aos jornalistas, no Parlamento.

A dirigente do Livre salientou que “o diálogo faz-se dialogando e não apenas incluindo medidas de outros partidos no programa de Governo“.

Numa primeira análise ao documento o Livre acusou o Governo de recuar em algumas promessas eleitorais feitas na campanha para as legislativas e insistiu que o Livre está disponível para conversar. “O Governo nesta situação terá que dialogar, e se o Governo não dialogar, se tentar esquivar-se ao escrutínio parlamentar, o Livre procurará outras forças para trazer à Assembleia da República a discussão de decretos de lei que o Governo produza e com as quais não nos sintamos confortáveis ou que ponham em causa direitos”, afirmou.

PAN acusa Governo de “falta de ambição climática” e retrocesso

Já a porta-voz do PAN considerou que o Programa denota “falta de ambição climática” e retrocessos na igualdade de género, criticando, à semelhança do Livre, que não tenha havido diálogo com os partidos da oposição.

Em declarações aos jornalistas, no Parlamento, Inês de Sousa Real defendeu que o debate em torno do programa de Governo “não pode ser um adiar das prioridades dos portugueses”, referindo que há uma “oportunidade que não deve ser desperdiçada, nomeadamente em matérias fundamentais como a saúde, o acesso à habitação”. 

A porta-voz do PAN defendeu ainda que “dizer que se acolheu mais de 60 medidas dos partidos não pode ser um monólogo”, salientando que o diálogo tem de ser “uma via de dois sentidos e não apenas acolherem aquilo que bem entendem”.

“Eu recordo que o Governo de Luís Montenegro não é um Governo de maioria absoluta, é um Governo minoritário, é um Governo que tem de necessariamente aproveitar esta oportunidade de uma maior pluralidade“, defendeu.

Questionada se o PAN está disponível para dialogar com o Governo, Sousa Real disse que o partido já manifestou essa disponibilidade, em particular em torno de matérias como a redução da carga fiscal, o acesso à habitação, a igualdade ou ensino superior.

Interrogada sobre qual vai ser o sentido de voto do PAN quanto à moção de rejeição do PCP, a deputada respondeu que o partido vai reunir a sua Comissão Política Nacional na quinta-feira para analisar essa matéria e o programa do Governo, assinalando que “neste momento está tudo em aberto”.

Chega vota contra moção de rejeição e saúda “aproximação” em certas áreas

O Chega começou por dizer que vai votar contra a moção de rejeição ao Programa do Governo apresentada pelo PCP e saudou uma “aproximação” em algumas matérias, como combate à corrupção ou fiscalidade, apesar de considerar também que é “muito vago e pouco ambicioso”.

Em declarações aos jornalistas na Assembleia da República, André Ventura considerou ser “importante que o Governo consiga cumprir as promessas que fez e tenha tempo para poder fazê-las e trabalhá-las nestes próximos meses, não daqui a um ano ou dois”.

“Ao mesmo tempo, é importante que quem apresenta moções de rejeição compreenda que não há outra alternativa neste quadro parlamentar. Aprovar uma moção de rejeição sem apresentar uma alternativa é o mesmo que dizer ao país ficarão ingovernáveis durante seis ou sete meses, é pura irresponsabilidade política”, justificou.

“Há uma aproximação às ideias do Chega, temos matéria para trabalhar e para continuar”, salientou.

Bloco avança com moção de rejeição

A coordenadora do BE, Mariana Mortágua, pronunciou-se para anunciar que o partido também vai apresentar uma moção de rejeição ao Programa do Governo, sustentando que as medidas transferem a riqueza de quem trabalha para grandes interesses económicos.

Não só não podemos acompanhar este programa como iremos apresentar uma moção de rejeição a um programa que tem uma visão do país que não podemos acompanhar“, anunciou Mariana Mortágua, em declarações aos jornalistas, na Assembleia da República.

A coordenadora do BE sustentou que este é “um programa de direita que quer governar para alguns e quer concentrar os recursos do país nas mãos de alguns”.

PCP considera que programa levará ao “agravamento das condições de vida”

O PCP, que no passado dia 13 de março já tinha anunciado que iria apresentar uma moção de rejeição ao documento, mas que tem chumbo assegurado, sem os votos do PS, considerou que o Programa “corresponde a um retrocesso que levará ao agravamento das condições de vida” em Portugal, considerando que justifica a moção apresentada pelo partido.

Pretende prosseguir uma opção da política de direita que está na origem dos problemas que afetam a vida das pessoas, o nosso país e que confirma a justeza da iniciativa do PCP da moção de rejeição do programa de Governo que vamos entregar hoje na Assembleia da República”, afirmou, em declarações a partir do Parlamento.

Paula Santos acrescentou também que “é um programa negativo por aquilo que contém e aquilo que omite”, que “não dá resposta, que não contém as soluções para os problemas dos trabalhadores e do povo” e que, por isso, “conta com a oposição do PCP”.

A deputada considerou ainda “um logro” que o Governo venha dizer que incluiu propostas do PCP no seu programa, salientando que a referência a uma medida sobre o desenvolvimento da capacidade produtiva da indústria conserveira, proposta pelos comunistas, “deixa de fora a dimensão, a amplitude e a abrangência” com que o partido apresentou um pacote de medidas para “valorizar o setor da pesca” em Portugal.

Interrogada se não considera que houve uma aproximação do executivo ao PCP, Paula Santos respondeu: “De todo. Não há qualquer aproximação”.

PS anuncia abstenção nas moções de rejeição do programa do Executivo

Já ao final da noite, e depois de ser eleita líder parlamentar do PS, Alexandra Leitão, anunciou que os socialistas vão abster-se nas votações das moções de rejeição do Programa de Governo apresentadas por PCP e BE.

“O PS, através do seu secretário-geral, já tinha dito que nesta primeira fase não iria bloquear o inicio de funções do Governo e portanto irá viabilizar o Programa do Governo, abstendo-se nas moções de rejeição“, anunciou aos jornalistas. 

A socialista destacou que o documento estratégico “é essencialmente semelhante ao programa eleitoral da AD”, o que disse ser compreensível. “E, na verdade, o que resulta na inclusão de medidas de outros partidos foi algo que foi feito unilateralmente e muito longe de qualquer tipo de diálogo. Foram escolhidas pelo próprio Governo as medidas que quiseram incluir, sem grande critério, sem atender à priorização que os próprios partidos tinham feito no seu programa eleitoral”, apontou.

Para a deputada, o Governo tem “o direito de o fazer assim”, mas não pode chamar diálogo “porque diálogo implica falar, conversar e nada disso foi feito”.

Segundo Alexandra Leitão, em termos do programa concreto há “algumas matérias que são muito preocupantes da perspetiva do PS”, dando como exemplo “a referência a revisitar a agenda do trabalho digno”, o “desvio de meios do SNS para privados” ou aspetos que eram consensuais na recuperação de rendimentos da administração pública e que agora “passaram a ser cautelosos, complexos”.

Recorde-se que o Programa do XXIV Governo Constitucional foi hoje entregue pelo ministro dos Assuntos Parlamentares, Pedro Duarte, ao presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco.

A entrega formal do programa, que estava prevista para as 11h45, foi feita na sala de visitas do parlamento já perto das 13h05, depois de o presidente da Assembleia da República sair da conferência de líderes parlamentares, que começou às 10h30 e só terminou perto das 12h50.

O programa vai ser discutido em plenário da Assembleia da República na quinta e na sexta-feira. 

O XXIV Governo Constitucional, chefiado por Luís Montenegro, tem o apoio de 80 deputados – 78 do PSD e 2 do CDS-PP – em 230, num parlamento em que o PS tem 78 lugares, o Chega 50, a Iniciativa Liberal 8, o BE 5, PCP 4, Livre também 4 e PAN 1.

[Notícia atualizada às 21h44]

Leia Também: AO MINUTO: BE vai avançar com moção de rejeição ao Programa do Governo

Compartilhar
Exit mobile version