Centenas de estudantes da Universidade de Lisboa ponderaram abandonar a faculdade, a maioria por se sentir psicologicamente esgotada, e 65% consideraram que o estado mental piorou após o início da pandemia. Estas são algumas das conclusões de um inquérito sobre a saúde mental dos universitários, realizado pela Associação Académica da Universidade de Lisboa, a 459 alunos, em março do ano passado.
O presidente da Associação Académica da Universidade de Lisboa, Afonso Garcia, diz ao JN que os dados são “preocupantes” e espera que o estudo seja “um incentivo” para a instituição académica reforçar o apoio psicológico aos jovens.
A pandemia de covid-19 piorou a saúde mental dos estudantes universitários de Lisboa, mas há outros fatores que poderão estar a contribuir para se sentirem pior. De “métodos de ensino antiquados” à “exigência dos cursos” e “elevada carga de trabalho semanal”, a dificuldade em pagar alimentação e casa é outra das preocupações dos estudantes, dos quais 204 já ponderaram desistir dos estudos.
“É uma geração que passou os primeiros anos de faculdade em pandemia e agora está a passar pelo aumento dos preços. As casas, em Lisboa, nunca estiveram tão caras e um estudante que não tem uma habitação estável e vê a sua vida cheia de problemas, é afetado na sua saúde mental e, consequentemente, pondera abandonar o curso”, explica Afonso Garcia.
O aluno de engenharia, que também participou na elaboração do estudo, revela que houve “um aumento claro dos estudantes que se deslocam às cantinas de ação social”. “É muito mais barato. Quando não está aberta, escolhem opções alimentares menos nutritivas e a questão da alimentação também afeta a saúde mental”, alerta.
“Não faz nada”
De acordo com o inquérito a estudantes da maior universidade do país, metade não se sentia bem física e psicologicamente, a maioria já sentiu crises de ansiedade e mais de 80% revelou ter sentido vontade de se isolar. Dos 459 inquiridos, 139 considerou que a universidade “não faz nada” no que diz respeito à saúde mental e só 30% tem acesso a consultas psicológicas regulares. A Associação Académica pede, por isso, mais apoio à academia e ao Governo.
“A maioria dos estudantes não está a ser acompanhada. Os que procuram um psicólogo no ensino superior não o encontram. Os psicólogos que a Universidade tem não são suficientes, nem são os recomendados pelo Governo”, diz o presidente da Associação Académica, que estabeleceu uma parceria com uma clínica privada para os alunos terem a primeira consulta gratuita e desconto nas restantes.
O inquérito refere ainda que 58% dos estudantes colocam os estudos em primeiro lugar, em detrimento da sua saúde mental, e 50% afirma que já apresentou dificuldades em dormir ou a acordar.
“Porque é que não é feita uma intervenção num estudante que decaia no seu desempenho académico? A partir do momento que não paga as propinas recebe uma série de notificações, mas se o seu rendimento estiver mau ou com burnout (esgotamento psicológico) ninguém quer saber, o que também demonstra uma clara desconsideração pela Universidade”, lamenta, acrescentando que “a instituição não aplica as recomendações da associação académica e quanto mais tempo passa mais estudantes sofrem com isto”.