“Os grandes senhores do mundo”, banqueiros, políticos, os protagonistas dos encontros Bilderberg, “todos esses perfis sociais facilmente identificados com personagens não só de Portugal, como do mundo”, inspiraram o espetáculo, disse o encenador.

 

Para Miguel Seabra, é um espetáculo “muito apropriado depois do que se passou com a eleição daquele senhor para presidente dos Estados Unidos da América”.

Com texto original de Mário Botequilha, ‘A Grande Reunião’ é posta em cena como ‘commedia dell´arte’, sem faltarem as máscaras, a lógica de humor e de improviso, nem a figura tipificada deste tipo de teatro originário de Itália, o Pantalone.

Xilofone, Mascarpone, Cicerone, Anticiclone e Burlone são os nomes dos cinco ‘Pantalones’ que evocam os senhores do mundo, “banqueiros, industriais, homens de negócios”, continuou a enumerar Miguel Seabra, numa relação de “todas essas” figuras responsáveis “pelas tramas de poder e pelas zonas de pouco acesso, ou nenhum, para as pessoas comuns”, onde essas tramas “são cozinhadas”.

Ricardo Salgado, que sofre de Alzheimer e responde em tribunal por 62 crimes alegadamente praticados entre 2009 e 2014, associados à derrocada do Grupo Espírito Santo, “um dos senhores que mais roubou, enganou e manipulou toda a sociedade portuguesa”, levando “muitas famílias à falência”, nas palavras de Miguel Seabra, Donald Trump, “um mentiroso, racista, xenófobo e facínora, que instigou o ataque ao Capitólio”, já condenado na justiça e em quem “80 milhões pessoas votaram” nas recentes presidenciais dos Estados Unidos, ou o “antigo primeiro-ministro José Sócrates”, que ainda aguarda julgamento, são, segundo Miguel Seabra, algumas das figuras que o público pode rever na peça.

“As pessoas pensam que os Pantalones são uma aristocracia, como a do czar da Rússia ou os lémures de Madagáscar. Mas não. O nosso modelo hereditário é mais parecido com o de uma estrebaria” – uma das falas da peça que satiriza os “donos do mundo, que nem se sabe bem quem são”, segundo Miguel Seabra. Mas que causam o caos económico, desastres ambientais e ditaduras populistas, acrescentou.

“O dinheiro é a ordem, é a prova inequívoca da existência de Deus, pois é perfeito, logo divino. No princípio, Ele criou o Céu e a Terra. Achou ‘poucachinho’. E [então] criou a Moedinha”, diz-se em ‘A Grande Reunião’.

O espetáculo não tem, todavia, qualquer pretensão moralista, sublinhou o encenador. Essa nunca foi a pretensão do Teatro Meridional.

Entre as funções da arte, prossegue Miguel Seabra, está “levantar tapetes, apontar, chamar as coisas pelos nomes, criar dimensões trágico-cómicas que levem as pessoas a acordar, refletir, divertirem-se e com isto ajudar o mundo a ir para a frente, a não se conformar”, concluiu.

‘A Grande Reunião’ é o quinto texto original de Mário Botequilha para a companhia sediada no Poço do Bispo, em Lisboa.

A interpretar estão Carlos Pereira, Catarina Mota, Diana Costa e Silva, Emanuel Arada, Henrique Gomes e José Mateus.

Em cena de 14 de novembro a 22 de dezembro, ‘A Grande Reunião’ tem sessões de quarta-feira a sábado, às 21 horas, e, ao domingo, às 16 horas.

No dia 8 de dezembro terá interpretação em Língua Gestual Portuguesa. O espetáculo conta ainda com uma sessão “excecional”, em 9 de dezembro, uma segunda-feira, direcionada, segundo Miguel Seabra, para profissionais com horários de trabalho semelhantes aos dos artistas.

O espaço cénico e os figurinos são de Hugo F. Matos, a música original e o espaço sonoro de Rui Rebelo, a assistência de encenação de Nádia Santos enquanto o atelier ‘commedia dell’arte’ é de Tobias Monteiro.

A criação seguinte do Teatro Meridional, a estrear em março de 2025, terá texto original de José Luís Peixoto e incidirá sobre questões relacionadas com imigração, revelou à Lusa Miguel Seabra.

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