O chefe de Estado-Maior da Armada Portuguesa, almirante Gouveia e Melo, admitiu, esta segunda-feira, que “os meios atuais não são suficientes” se considerarmos que estamos num momento internacional “muito crítico” no que diz respeito à Defesa, defendendo que se deve criar “dissuasão para que o outro lado”, especificamente a Rússia, “por erro de cálculo, não pense que pode avançar para além do que já avançou”. 

“Considero que é importante ter uma força credível e capaz de manter, pelo menos, a capacidade de vigilância, dissuasora, de qualquer atividade contrária aos interesses do Estado português e aos interesses dos aliados, no nosso mar que é imenso, que é do tamanho, quase, da Europa”, afirmou Gouveia e Melo, numa entrevista à TVI, após ser questionado sobre se é crucial um investimento em mais embarcações para vigiar e defender a Zona Económica Exclusiva de Portugal. 

Olhando para a atual capacidade de Defesa do país, admitiu: “Os meios atuais não são suficientes [para garantir dissuasão] se considerarmos que estamos perante um período internacional muito crítico, com uma eventual escalada”. 

Desta forma, uma vez que “parece ser necessário investirmos em Defesa”, o almirante Gouveia e Melo considerou que “podemos investir de forma mais inteligente ou menos inteligente”

“A forma mais inteligente é, ao fazer esse investimento, tentar alavancar a nossa indústria e as nossas capacidades tecnológicas, capacitando também a economia nacional”, disse.

Para exemplificar, deu nota de que “o verdadeiro valor de um submarino não esta só no casco, está no miolo e, nesse miolo, podem participar empresas portuguesas”.  

Quanto a uma guerra com a Rússia nos próximos anos, Gouveia e Melo admitiu “partilhar a preocupação” que tem sido transmitida por várias líderes europeus, mas entende que esse conflito “depende muito das ações do Ocidente neste período”.

“Temos de criar a dissuasão suficiente para que o outro lado, por erro de cálculo, não pense que pode avançar para além do que já avançou. Porque aí, sim, entraremos em confronto. Há vontade de investir o suficiente em capacidade material e em capacidade humana para evitar o confronto? Ou, se não o fizermos, daremos um sinal de fraqueza ao outro lado, que pensará que pode prosseguir a sua estratégia e lentamente ir avançando para Oeste? Esta é a grande questão”, atirou.

Para o chefe de Estado-Maior da Armada Portuguesa, “aquilo que os chefes militares estão a tentar fazer é mostrar às populações e também, indiretamente, ao poder político, a necessidade de olharmos, de forma preventiva para o problema”. “Porque reagir ao problema será sempre 20 vezes pior do que de forma preventiva evitar o problema”, alertou.

Quanto ao serviço militar obrigatório, apontou: “Eu não defendo o serviço militar obrigatório nos moldes que nós conhecemos antigamente, porque não acrescentava grande produto”.

“Defendo um sistema – que tem de ser criado e há já alguns na Europa nesse caminho – que seja capaz de mobilizar a população, formando e treinando em antecedência essa população, através de determinados sistemas e determinados períodos, sem afetar muito quer a liberdade dessa população, quer a economia dessa população. Esse sistema, que já foi testado noutros países com sucesso, é um sistema que retira o conhecimento que existe hoje só nos [exércitos] profissionais, que são muito poucos, e alarga esse conhecimento de forma mais abrangente à própria população. E isso só em si é uma capacidade mobilizadora em caso de necessidade e também de substituir se houver perdas humanas”, explicou.

“Há muitas formas de contribuir para a Defesa, desde a engenharia, desde uma economia preparada para se especializar para, em caso disso, em determinados produtos. Tem de haver uma ideia muito mais alargada de Defesa. Não é o conceito antigo de ‘nós agora vamos perder um ano ou dois anos, num quartel, para aprender a marchar’. Isso está completamente fora de questão”, frisou.

Na mesma entrevista, foi também abordada uma eventual candidatura à Presidência da República, mas Gouveia e Melo recusou falar sobre o tema.

“É um cenário sobre o qual não quero falar. E não quero falar também porque não posso falar. Eu sou um militar no ativo, não convém, não me é legítimo, estar a falar sobre opções políticas”, defendeu.

“Em termos éticos, ou eu desisto de ser chefe militar e terei a liberdade toda para fazer o que quero ou, se quero continuar a ser chefe militar, devo, em termos de ética militar, cingir-me aos aspetos militares”, completou.

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