Segundo Paulo Lucas, da Zero — Associação Sistema Terrestre Sustentável, “setembro costuma ser um mês relativamente imprevisível” e, por isso, têm de se identificar “quais são os pontos críticos mais suscetíveis à erosão para, muito rapidamente” se fazerem intervenções “no sentido de conter a erosão nesses espaços e o arrastamento do solo, das cinzas”.

 

“Para prevenir que até haja derrocadas e outras coisas que podem acontecer agora nos próximos tempos, se efetivamente nós tivermos uma meteorologia que também seja desfavorável”, acrescentou, em declarações à Lusa.

Nesse sentido, defendeu que, após o rescaldo dos incêndios, o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), em conjunto com municípios, associações florestais e outras entidades, deve avançar, no prazo de 15 dias, com o levantamento das situações e atuar no máximo após um mês pois, atrasando-se “as intervenções nos sítios mais críticos”, pode surgir “uma situação muito grave” a juntar à já existente.

“É muito importante que as autoridades não fiquem de braços cruzados, elaborem já estes relatórios”, salientou Paulo Lucas, com vista a tomar “medidas para evitar precisamente danos maiores”, principalmente no que tem a ver com arrastamento do solo ou de “cinzas poluentes para os cursos de água”.

“Temos que limitar ao máximo possível essas ocorrências, para não acrescentarmos catástrofe à catástrofe dos incêndios. O Estado, em primeiro lugar, tem que garantir que existem recursos financeiros de emergência, para além daqueles que vão ser dados para recuperar habitações”, e reparar os danos provocados pelos fogos, notou o dirigente da Zero, acrescentando que também tem de se investir na “estabilização do solo”.

Para Paulo Lucas, os recursos para recuperar os milhares de hectares afetados devem ser “disponibilizados o mais rapidamente possível”, através de mecanismos simplificados, sem “muitas burocracias associadas”, embora “garantindo a transparência” para evitar “situações menos corretas do ponto de vista da atribuição de empreitadas”.

O especialista, que coordena as áreas de sistemas de conservação, biodiversidade e florestas, admitiu que esta pode ser também “uma oportunidade para reordenar um pouco a paisagem”, mas sem avançar imediatamente para reflorestações, que só devem ocorrer no próximo ano, pois “o solo tem que estar estabilizado”.

Além das zonas com espécies de produção, como o pinheiro e o eucalipto, Paulo Lucas referiu “também a oportunidade para fazer outro tipo de floresta nas áreas ardidas”, nomeadamente plantando “carvalhais ou outras espécies autóctones nessas áreas” ou “deixar a natureza fazer o seu trabalho”.

“Há um discurso contra a natureza que não é muito correto neste país, em que há uma lógica de que tem que estar tudo limpinho, que nós temos que ter o país todo limpinho para não haver progressão dos fogos”, apontou o especialista, criticando que parece haver “uma cruzada contra a floresta” e “contra os matos”, quando “os incêndios não são causados nem pelos matos, nem pela floresta, são causados por pessoas”.

Seja por negligência ou incendiarismo haverá sempre fogos, mas o dirigente da Zero notou que estão em discussão pública vários planos de reordenamento e gestão da paisagem, que constituem uma oportunidade para “um trabalho sério de reordenamento”, tornando o território “mais resiliente” e resistente à propagação dos incêndios.

O responsável da organização não governamental (ONG) de ambiente advogou que, neste momento, é urgente “proteger o solo que há”, que “já é pouco e não podemos perder ainda mais”, e estabilizar os terrenos, com barreiras nas linhas de água, aproveitando os restos de árvores que arderam para criar estilha para cobrir o solo.

“Não podemos ficar de braços cruzados à espera da chuva (…) isso é que é a pior coisa que pode acontecer, é ficarmos de braços cruzados”, rematou.

Sete pessoas morreram e 161 ficaram feridas devido aos incêndios que atingem desde domingo sobretudo as regiões Norte e Centro do país, nos distritos de Aveiro, Porto, Vila Real, Braga, Viseu e Coimbra, e que destruíram dezenas de casas.

A Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC) contabiliza cinco mortos, excluindo da contagem dois civis que morreram de doença súbita.

A área ardida em Portugal continental desde domingo ultrapassa os 121 mil hectares, segundo o sistema europeu Copernicus, que mostra que nas regiões Norte e Centro já arderam mais de 100 mil hectares, 83% da área ardida em todo o território nacional.

O Governo declarou situação de calamidade em todos os municípios afetados pelos incêndios nos últimos dias e sexta-feira dia de luto nacional.

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