iolanda, com o tema ‘Grito’, foi a artista escolhida para representar Portugal na 68.ª edição do Festival Eurovisão da Canção e sobe ao maior palco de música já esta terça-feira, 7 de maio, para a primeira semifinal do certame.

Natural da Figueira da Foz, descreve-se como uma “miúda do campo” e a aldeia da Fontela, onde passou a infância em casa da avó paterna, foi o ‘pontapé de saída’ para ‘Grito’, uma música que “fala sobre eliminar todos os fantasmas interiores”, sendo “uma tentativa de ser ouvida”.

Estreou-se em concursos de televisão com apenas 14 anos e nunca desistiu de uma carreira no mundo da música porque, “apesar de alguns terem corrido menos bem”, deram-lhe “força para fazer aquilo” que faz hoje. Foi com essa força e perseverança que, em 2023, lançou o EP [‘Extended Play’] ‘Cura’ e entrou para a lista dos ’50 melhores álbuns portugueses’ do ano, da revista Blitz.

Dois meses após ter vencido o Festival da Canção, a cantora conta ao Notícias ao Minuto como tem sido esta “jornada incrível” e o que tem preparado para o futuro, sempre com a promessa de “trazer algo novo” para o país.

Está prestes a subir ao palco da Eurovisão. Como tem sido a jornada desde que venceu o Festival da Canção até aqui?

A jornada tem sido incrível. Temos trabalhado 24/7 para poder ter o melhor palco de sempre e poder apresentar a canção da melhor maneira, da forma que ela merece.

Sou muito mais feliz no campo e foi muito especial ter ido para a Fontela, para uma casa que me traz muitas memórias de infância, escrever uma canção que é tão especial para mim e fala sobre eliminar todos os fantasmas interiores

Como foi o processo de criação de ‘Grito’?

O processo de escrita foi, na verdade, até bastante simples. Começámos a escrever a canção há cerca de um ano e meio, mas depois deixámo-la parada durante um ano porque estive a trabalhar noutros temas. Quando surgiu a oportunidade de ir ao Festival da Canção, voltei a pensar nesta canção e depois terminei-a. Já tinha o refrão, o pré-refrão e um verso, então foi só fazer a segunda parte.

Comecei a escrevê-la em casa da minha avó, na Fontela (Figueira da Foz), e depois terminei-a já em Lisboa com todas as pessoas que estiveram envolvidas, desde a mistura à masterização. Foi mesmo um processo simples, surgiu-me de uma forma muito natural.

Começou a escrever ‘Grito’ em casa avó e o avô acompanhou-a no Festival da Canção. A família tem sido um apoio importante?

Esses são os meus avós maternos e a casa onde escrevi pertence aos meus avós paternos, que já não estão connosco. Foi muito importante ter escrito a canção naquela casa, que tem muitas memórias e traz-me muita paz. Sou uma miúda do campo e sempre serei. Não fui feita para morar na cidade, apesar de agora morar. Sou muito mais feliz no campo e foi muito especial ter ido para a Fontela, para uma casa que me traz muitas memórias de infância, escrever uma canção que é tão especial para mim e fala sobre eliminar todos os fantasmas interiores. Foi a cereja no topo do bolo.

Subiu ao palco do Festival da Canção apontada como a grande favorita desde o início. Sentiu mais pressão por isso?

Sim, um bocadinho. Acho que há sempre pressão. Mas eu estive muito afastada das redes sociais na altura porque não me fazia sentido ter essa pressão e tinha uma equipa para segurar também. Quis muito ter força suficiente, independentemente das apostas e de ser a favorita ou não. Quis mesmo ter a certeza de que o estava a fazer pelas razões certas – que era pela música. E fizemos acontecer.

iolanda – Grito | Final | Festival da Canção 2024

Ao Notícias ao Minuto, referiu anteriormente que se tratava de “um grito” para se fazer ouvir, mas também de “uma mensagem transversal”. Tem conseguido passar essa mensagem?

Sem dúvida alguma. Acho até muito engraçado as pessoas terem começado a perceber o significado da canção sem eu ter de o explicar. Até na questão dos bailarinos foi muito interessante perceber que as pessoas entendem o significado através de uma imagem. Sem eu ter de explicar, as pessoas conseguiram perceber que os bailarinos representavam as minhas sensações, as minhas emoções a viver à flor da pele. Conseguiram perceber que é uma tentativa de ser ouvida. 

Se não tivesse recebido o convite para o Festival da Canção, iria sem dúvida enviar uma livre submissão 

Disse-nos também que, caso não tivesse recebido o convite, iria enviar uma submissão livre…

Sempre foi essa a ideia desde o início. Senti que era esse o próximo passo na minha carreira. Acabei por não o fazer porque recebi o convite, mas, se não o tivesse recebido, iria sem dúvida enviar uma livre submissão. 

Porquê o Festival da Canção?

Por ser um espaço onde se celebra a música feita por portugueses e, para mim, seria o mesmo o passo seguinte de carreira. Já lancei o meu primeiro EP e estou a trabalhar num álbum. Portanto, senti que tinha espaço para encaixar o Festival da Canção e foi essa a razão.

Não tenho qualquer receio nem medo associado à casa de apostas. Pode acontecer o que aconteceu com os Black Mamba, como pode não acontecer. O que me interessa é chegar e cantar a canção em condições e mostrar a minha arte a mais de 200 milhões de pessoas  

Portugal não se encontra bem posicionado na casa de apostas. Poderá acontecer o mesmo que aconteceu em 2021, quando os Black Mamba conquistaram os eurofãs após a divulgação das primeiras imagens?

Acho que Portugal tem um problema grave, que é não ter vizinhos. Só temos Espanha e isso, à partida, coloca-nos numa posição mais desfavorecida a nível de apostas. Apesar de a Eurovisão ser um concurso sobre música, também tem os países a votarem nos seus países amigos e etc., por uma questão de proximidade. Acho, no entanto, que tudo está sempre em constante mudança e é a partir dos ensaios que começa o concurso a sério. Não tenho qualquer receio nem medo associado à casa de apostas. Pode acontecer o que aconteceu com os Black Mamba, como pode não acontecer. O que me interessa é chegar e cantar a canção em condições e mostrar a minha arte a mais de 200 milhões de pessoas. 

Tenho estado a par do que as pessoas dizem e estou muito feliz por me consideraram uma das vozes do país e uma das vozes da Eurovisão. Isso é mais do que qualquer aposta para mim

Há pouco referiu que não acompanhou as críticas em relação ao Festival da Canção. Mudou de posição agora com a Eurovisão?

Sim, sim. Tenho estado a par, tenho acompanhado algumas [críticas], mas são muitas. Tenho estado a par do que as pessoas dizem e estou muito feliz por me consideraram uma das vozes do país e uma das vozes da Eurovisão. Isso é mais do que qualquer aposta para mim.

Não vamos ter fogo, nem malta a descer de elevadores, que era uma das ideias que estava a circular nas redes sociais. Vamos levar a mesma canção, obviamente, com a mesma versão

O que vai haver de diferente em relação à atuação do Festival da Canção?

Não posso desenvolver muito, mas vamos levar os cinco bailarinos e vamos manter o branco. Não vamos ter fogo nem elevadores, nem malta a descer de elevadores, que era uma das ideias que estava a circular nas redes sociais. Vamos levar a mesma canção, obviamente, com a mesma versão. Haverá algumas alterações, uma vez que o palco é um bocadinho maior – umas oito vezes maior – do que o palco do Festival da Canção. As alterações vão rodar muito à base do palco para o podermos usar da melhor forma possível.

Está nervosa?

Acho que estou ansiosa por chegar, ainda não estou nervosa, mas tenho a certeza de que vou começar a ficar nervosa entretanto. Se não ficar nervosa, significa que isto não interessa para nada.

Participou na Pre Party em Madrid no final de março. Conseguiu sentir o espírito eurovisivo com essa experiência?

É uma mini Eurovisão, diria. É o início de uma festa que acontece em Madrid e noutros países. Eu não fui às outras porque estava a preparar as minhas duas datas no Capitólio, que acontecem logo depois da Eurovisão aqui em Lisboa. Mas foi uma pré-Eurovisão, deu para conhecer o espírito e os colegas e conectar um pouco com toda a gente.

Se pudesse representar Portugal com a música de um artista de outro país, qual seria? E porquê?

Seria a canção da Grécia: ‘Zari’ da Marina Satti. Porque é uma canção divertida e nós temos muitas parecenças com a Grécia em vários momentos. Não a nível de letra, obviamente, porque eles têm uma língua muito mais complicada – e eles devem achar o mesmo de nós, provavelmente. Mas pronto, pela ‘vibe’ da música, por ser uma música mega contrastante com a minha e por me sentir atraída pela sonoridade. 

E se fosse então uma música de outro artista de qualquer outro ano?

Diria, talvez, ‘Rise Like a Phoenix’, de Conchita Wurst.

Acho que a participação de Israel é obviamente uma participação contestável (…)  mas é um festival de música e a responsabilidade, antes de recair sobre os artistas, tem de recair nas organizações que falharam até aqui

Na altura em que participou na Pre Party, assinou, em conjunto com outros artistas da Eurovisão, uma carta em que apelaram à paz e a um cessar-fogo na Faixa de Gaza. Como surgiu essa iniciativa?

Recebemos um e-mail por parte da equipa do Olly Alexander [representante do Reino Unido] com uma intenção de fazer um apelo à paz e eu uso sempre a minha voz para apoiar aquilo em que acredito e a paz é uma das causas em que eu acredito e acho que é urgente. Portanto, decidi seguir com este apoio.

Todas as delegações receberam esse e-mail?

Não tenho a certeza, mas acredito que tenham sido todos avisados. Mas acho que foi uma coisa que surgiu muito à última hora e, provavelmente, houve muitas delegações que não tiveram logo acesso porque foi uma coisa muito rápida.

Concorda com a participação de Israel no concurso, apesar da atual ofensiva na Faixa de Gaza?

Acho que a participação de Israel é obviamente uma participação contestável. Acho que a Eden Golan [representante de Israel] está a ter um ‘double standard’ que a Rússia, por exemplo, não teve, mas é um festival de música e a responsabilidade, antes de recair sobre os artistas, tem de recair nas organizações que falharam até aqui.

Voltando à iolanda, estreou-se em concursos de música com apenas 14 anos, quando participou em ‘Uma Canção para Ti’. Seguiram-se os ‘Ídolos’ e ‘The Voice’. Como é que estas experiências marcaram o seu percurso musical?

Estas experiências deram-me muitas ferramentas para poder ser quem sou hoje e para poder fazer a música que eu faço. Além de ter aprendido muito sobre a indústria, aprendi também sobre aquilo que eu não quero fazer e deu-me força.

Apesar de alguns terem corrido menos bem do que outros, acho que nenhum correu mal. Tirando o ‘The Voice’, cheguei sempre a uma posição boa tendo em conta que são milhares e milhares de pessoas. Nos ‘Ídolos’ cheguei aos 15 finalistas, em ‘Uma Canção Para Ti’ cheguei às galas. A vitória não é sempre a última instância quando se participa num programa de televisão, mas todos esses programas deram-me força para poder fazer aquilo que faço hoje e para ter as ferramentas para lidar com as situações menos boas e até menos más.

A iolanda acaba também por ser mais um exemplo de uma artista que participou num concurso de televisão, não venceu mas conseguiu vingar no mundo da música…

Exatamente. Acho que fazer coisas dentro da cultura do nosso país é o que interessa e devemos fazer sempre cada vez mais até que nos ouçam e até que consigamos ter um lugar na indústria. É sempre complicado, é um país pequeno e a Cultura não é de todo apoiada e, portanto, temos de fazer por nós.

O que é acha que falta fazer em Portugal para melhorar a Cultura e a indústria da música?

Começar por pedir às comissões políticas que abordem o assunto Cultura nos seus planos de apresentação dos partidos. Ensinar nas escolas mais coisas do que as que se ensinam atualmente. Fazer até uma mudança na forma como a televisão funciona hoje em dia. Podermos ver o que é que os outros países fazem e porque é que estamos a ficar tão para trás. O Governo pode também fazer um maior investimento na Cultura, ou algum investimento que seja, porque cada vez mais o investimento vai sendo menor.

O próximo álbum ainda não sei bem como vai soar, estamos a trabalhar nele ainda, estamos a construí-lo. Estou a caminhar para uma ‘vibe’ mais ‘pop’

No ano passado, lançou o ‘Cura’, um EP com apenas sete temas, mas recheado de diferentes géneros musicais. Quem são as suas principais inspirações?

O EP tem bastantes inspirações, desde coisas que eu ouvia até música tradicional portuguesa e algum fado. Apesar de não ser fadista, ouvia muito Amália e acho que isso também sempre se sente no EP a nível de melodia e harmonia. Há também algum flamenco a nível de sonoridade, que ouvia muito na altura, e um bocadinho de ‘hip-hop’.

Encontrou a sua ‘Cura’ ou ‘Lugar Certo’?

Sim. Claro que sim. Aliás, a ‘Cura’ é o EP inteiro, o facto de eu o ter escrito foi o que me deu essa paz interior que eu já precisava há algum tempo.

Com quem gostaria de fazer uma colaboração para o próximo álbum?

Na verdade, já estou a trabalhar com quem gostaria. É o meu produtor – o Luar – que está na direção de produção do álbum inteiro. Depois trabalharei com um ou dois produtores com quem já delineei as faixas. É sempre um trabalho de colaboração, nunca trabalho apenas só com um. Apesar de o centro de produção ser sempre o Luar, trabalhamos com mais pessoas para poder ter o máximo de variedade de sonoridade dentro do projeto.

Mas o próximo álbum ainda não sei bem como vai soar, estamos a trabalhar nele ainda, estamos a construí-lo. Estou a caminhar para uma ‘vibe’ mais ‘pop’, que é o caminho que eu sempre quis seguir, mas sempre a manter a minha sonoridade nas canções.

Podem esperar muita vontade de continuar a fazer música e de trazer a este país alguma coisa nova. É sempre isso que eu pretendo com as minhas canções

Depois da Eurovisão terá os primeiros concertos em nome próprio no Capitólio, um dos quais já esgotou e o outro já está com disponibilidade limitada. Estava à espera desta receção do público?

Não. Na verdade, quando os meus ‘managers’ me perguntaram se eu queria fazer o Capitólio, eu disse-lhes que eles eram loucos. Achava que era um passo muito grande, um passo maior do que a perna. Mas acreditei e eles tinham razão. Fiquei muito feliz com todo o amor e muito grata por estar onde estou neste momento e estar a fazer aquilo de que mais gosto, além de ter oportunidade de o fazer todos os dias.

E para o futuro? O que podemos esperar da iolanda?

Podem esperar muita vontade de continuar a fazer música e de trazer a este país alguma coisa nova. É sempre isso que eu pretendo com as minhas canções e na forma como as apresento, seja musical ou visualmente. Podem esperar mais concertos, com datas que iremos anunciar em breve, e muita música nova.

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